Icaraíma, 27 de abril de 2024

Sobrevivente de enchente no RS, foi arrastada por 18 quilômetros, agarrada ao telhado de casa

Sobrevivente de enchente no RS, foi arrastada por 18 quilômetros, agarrada ao telhado de casa

DAS QUATRO PESSOAS QUE ESTAVAM COM JANETE MARIA NARDINI ZÍLIO, 57 ANOS, UMA MORREU E DUAS CONTINUAM DESAPARECIDAS

Janete Maria Nardini Zílio não sabe nadar, nem gosta de água. Aos 57 anos e há 35 morando à beira do Rio Taquari na cidade de Muçum, RS., jamais ousou banhar-se no leito que corre diante de casa.

Na madrugada do último dia 5, Janete foi arrastada 18 quilômetros rio abaixo, agarrada a um telhado de zinco que cambalhotava em meio à correnteza que matou 16 pessoas e destruiu 80% da estrutura urbana de Muçum, no Vale do Taquari, RS.

Das quatro pessoas que estavam em casa com ela, uma morreu e duas continuam desaparecidas. Um cunhado sobreviveu abraçado ao topo de uma árvore. Janete foi resgatada na entrada do município, praticamente laçada por moradores, que jogaram uma corda ao ouvirem gritos de socorro vindos do meio do rio.

Havia sido um final de semana festivo na propriedade dos Zílio, uma das mais antigas famílias de imigrantes italianos que se estabeleceram em Muçum no final do século 19.

Instalados em Linha Alegre, localidade rural a cerca de 20 quilômetros do centro, eles cultivavam uva, tomate, feijão e mantinham quatro vacas de leite em um sítio de 14 hectares.

No domingo (3 de setembro), o marido de Janete, Raul, e o irmão gêmeo, Roque, completaram 61 anos de idade.A chuva que persistia desde a noite anterior não atrapalhou o churrasco de aniversário.

Na casa recém-construída de Raul e Janete, estavam Roque e a esposa, Marta, outro irmão mais velho, Sérgio, 66 anos, a mulher dele, Terezinha Torres da Silva, 68, e o patriarca dos Zílio, Deoclydes José, 94.

Houve festa e cantoria até o fim daquela tarde, quando Marta foi embora para Bento Gonçalves, onde mora.

De férias, Roque decidiu ficar mais alguns dias, seguido por Sérgio e Teresa, ambos aposentados e residentes em São Leopoldo. Mas ele já não tinha mais força e eu não podia me largar conta Janete.Logo em seguida, uma nova onda derrubou as paredes restantes. Sem enxergar, Sérgio e Deoclydes mergulharam na água, e Janete procurava onde se agarrar.

Ao ver o telhado flutuando, segurou-se na beira da folha de zinco. Quando percebeu, tinha Terezinha abraçada às pernas. Ela ainda tentou fazer a cunhada subir escalando seu corpo, mas a parente escapou e nunca mais foi vista.

Longe dali, Roque se abraçou ao topo de uma árvore.Numa manobra arriscada, Janete conseguiu jogar o corpo no topo do telhado. Estendida sobre o zinco e com os dedos grudados às bordas onduladas da cobertura, começou a ser arrastada pela correnteza.

Com o Taquari escapando ao leito, o telhado era uma jangada sem freios em meio ao rafting involuntário da chuvarada.

Fonte: Diário Gaúcho

Foto: Jefferson Botega/Agência RBS

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